segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

Post de apresentação!

É com prazer que inicio as conversas por aqui (que espero sejam numerosas, intensas e frutíferas).

da nudez, da mentira e da cumplicidade é um dos atuais projetos de criação em Dança em desenvolvimento pelo coletivo Couve-flor minicomunidade artística mundial. Trata-se de um solo meu (Ricardo Marinelli), no entanto a equipe de criação compreende os seguintes artistas convidados: Elisabete Finger (olhar exterior); Amábilis de Jesus (consultoria de objetos de cena); Fábia Guimarães (consultoria de iluminação); Alexandre Nero e Gilson Fukushima (consultoria sonora); Aurélio Dominoni (conceito visual) e mais as colaborações de Cláudia Washington, Ronie Rodrigues, Leo Glück, Juliana Adur e Neto Machado.

Um solo feito a muitas mãos, que recebeu o Prêmio Klauss Vianna de fomento à dança 2007/2008 e vem sendo desenvolvido desde agosto passado, ocasião em que o couve-flor esteve em residência artística em Teresina-PI, junto ao Núcleo de criação do Dirceu.

O projeto completo compreende a criação de um espetáculo, a realização de uma oficina de criação a partir do processo e a publicação de um caderno que problematize as questões propostas.

SOBRE O PROJETO ARTÍSTICO

Dando continuidade a uma série de interesses presentes na trajetória do artista proponente, este projeto coreográfico tem algumas questões como ponto de partida: a busca de novos modos de relacionar dança em cena e espectador, propondo efetivar conexões de co-responsabilidade; discussão da nudez do/no movimento como forma de construir cumplicidades entre obra e público; relações afetivas e violência simbólica; mentira e verdade na cena e na vida.

Entendendo coreografia como a articulação artificial — e sempre artificial — entre corpo em movimento, tempo e espaço, a investigação estará centrada nas ações corporais como chaves para a construção de um corpo que verdadeira e honestamente mente estar nu, e portanto partilha fragilidades.

Mentir honesta e verdadeiramente a partir da capacidade gramatical da organização coreográfica e de possíveis idéias de nudez, eis o escopo inicial da pergunta dançante aqui proposta.

Pontos de partida da pesquisa

Há muito me interesso pela empatia que pode se construir entre obra cênica e público a partir da exposição frágil do artista. Me parece que o mecanismo que opera na construção dessa espécie de cumplicidade, entre quem vê e quem faz, tem relação com as formas de estar nu diante de alguém. Trata-se, talvez, de um processo de identificação que se dá sensorialmente e pelo acionamento de algo relacionado com a memória, como se a atitude nua de certa forma me desnudasse. Isso tudo, no caso da organização cênica, é atravessado por uma importante questão: a cena é artificial, e ao ser artificial, é de certo modo mentirosa. Como se desnudar e mentir ao mesmo tempo?

Fragilidade, cumplicidade, nudez e mentira parecem palavras que oferecem articulações interessantes para esse projeto. Tentando esmiuçar melhor essas idéias:
O formato do meu corpo e a forma com que ele se move distingue e define em mim algum tipo de identidade? Como isso se revela? Na verdade, será que se revela? Tirar toda a roupa é um jeito de revelar essas intimidades? Estar pelado é estar mostrando intimidade e identidade? É ficar obrigatória e completamente nu? Como fico nu sem ficar pelado? E como fico nu estando pelado? Como a nudez pode existir/existe no corpo em movimento? Tais perguntas ajudam a circunscrever meu quase obsessivo interesse por revelar intimidades que residem no corpo em movimento. A idéia de nudez aparece aqui como limite a perseguir nas ações organizadas em cena. Resgatar minhas intimidades e encontrar formas de torna-las públicas, configurando assim uma ação que me desnuda. Perseguir a nudez é, por conseqüência, perseguir uma organização cênica que coloca em jogo fragilidades. Não se trata de um estado unicamente vulnerável, mas de uma presença orquestradamente frágil.

O trânsito que estabelece entre nudez e fragilidade tem como pano de fundo a intenção de construir entre público e obra uma relação de cumplicidade. Artista e platéia são cúmplices no sentido de compartilharem, em alguma medida, a humanidade que reside no estado frágil.

E todas essas relações se estabelecem num ambiente artificializado. Não me interessa desconsiderar que a cena é impreterivelmente um contexto artificial. Ou seja, mesmo que meu esforço artístico-investigativo seja por perseguir a nudez, ela será exposta numa situação controlada, e portanto com boa dose de mentira.

É por estas questões que eu e minha equipe temos caminhado.
Algo a dizer?
Afim de se desnudar?
Afim de me desnudar?

Ricardo Marinelli